Um dia alguém vai chegar pra você e dizer ‘Ei, cara, faz um sistema pra mim’.
Eu lhe desejo duas coisas:
- Que esse dia não demore muito;
- Que você esteja realmente preparado quando este dia chegar.
Mexer com códigos, abstração, diagramas e linguagens diversas pode parecer uma dor de cabeça, mas pra mim é prazeroso. Quando criança eu montava quebra cabeças, hoje desenvolvo sistemas. Ou seja, continuo ‘brincando’. No que depender de mim vou fazer com que isso seja uma brincadeira pra você também.
E então, vamos brincar? Voltando ao começo da conversa, alguém – possível cliente – veio a você solicitar um sistema. De cara vou lhe dizer algumas coisas que você NÃO DEVE fazer:
- Não acredite que é só ‘um sisteminha’;
- Não estipule prazo e MUITO MENOS VALOR sem antes fazer um detalhado levantamento de requisitos e uma análise inicial do projeto;
- Não diga sim logo de cara;
- Não dispense o cliente logo de cara.
Agora, com base nos tópicos acima, vamos falar sobre o que você DEVE fazer e porque fazê-lo:
1 – Trate bem a todos os que lhe procurarem
Antes de avaliar o cliente, a empresa e o projeto você não tem como identificar quanto trabalho e lucro o sistema vai lhe trazer. Há muitas formas de ganhar dinheiro nessa área. E muitas formas de se perder também. Portanto, resista à ansiedade de dizer sim logo de cara e controle a antipatia de dispensar um cliente só porque o sistema parece ser ‘besta demais’ pra você perder seu tempo com ele. Avalie antes. Veja com calma e só depois dê sua resposta final. Dê um mínimo de consideração a quem lhe procura porque hoje ele pode ser apenas o dono da budega da esquina mas daqui a um ano ele pode ser proprietário do maior supermercado da sua cidade. Além do que, bem ou mal, ele vai falar de você, da forma como você o atendeu, do trabalho que você fez ou não pra ele então … seja gentil e ao menos avalie a solicitação dele, ok? Depois se não der mesmo pra você, então você coloca isso com jeitinho, expõe sua metodologia de trabalho, seus recursos, custos de desenvolvimento e, se possível, já indica um ou dois nomes de outros desenvolvedores que podem atender o cliente em questão. Garanto que ele vai ficar satisfeito com sua postura e, dependendo de como for, pode até aumentar o escopo do sistema só pra garantir trabalhar com alguém profissional – e não arrogante – como você, além de lhe indicar aos amigos dele.
2 – Local e momento Ideal para o levantamento de requisitos
Bom, cada caso é um caso. Eu particularmente gosto de fazer o levantamento de requisitos na empresa do cliente e costumo marcar para as primeiras horas da manhã porque neste momento as pessoas costuma ainda estar tranqüilas e relativamente disponíveis. Mas nem sempre isso é possível, seja pelo cliente não estar na empresa neste horário, seja por a empresa não estar assim tão perto de você – pode ser em outro estado, por exemplo. Bom, neste caso procure um local/ambiente onde vocês não sejam interrompidos. Uma meia hora pode ser o suficiente para uma primeira análise – nota: ‘primeira análise’. Quero dizer com isso que o levantamento de requisitos não é feito numa única visita. Se possível peça ao cliente amostra de planilhas, relatórios, formulários que ele deseja que sejam gerados pelo sistema. Você precisa literalmente VER tudo o que o cliente quer.
3 – Pergunte como se estivesse pra ser contratado para trabalhar dentro da empresa do cliente.
Não posso lhe dizer ‘o que’ perguntar ao cliente porque ‘cada caso é um caso’. Mas imagine-se sendo contratado para trabalhar na empresa. O que você precisa saber para executar bem seu trabalho? Quais são os procedimentos? Quantas pessoas vão trabalhar com você? Como é a divisão de tarefas? Quais os horários de pico? São muitos os fatores relevantes no dia a dia de um funcionário – futuro usuário do seu sistema – e tudo é informação relevante para você, desenvolvedor.
4 – Saiba ouvir
No livro Dicas de Feedback de Bernardo Leite Moreira ele da uma dica preciosa: não interrompa o outro enquanto ele esta falando. Se ele fizer uma pausa enquanto busca as palavras pra se expressar, resista à tentação de colocar estas palavras na boca dele. Ao invés de ajudar você pode acabar atrapalhando o raciocínio dele. Deixe que ele fale e depois repita, com suas palavras, o que ele falou, para ter certeza – e demonstrar – que realmente entendeu o que ele quis dizer. Isso é ótimo porque, em primeiro lugar, as pessoas gostam de falar e, principalmente, de ter quem as escute e, em segundo lugar, ele vai notar que você esta realmente atento ao que ele diz e é capaz de entender suas necessidades. Vai deixá-lo confiante de que você é ‘o cara certo’ pra fazer o sistema dele.
Tenha em mãos caneta e bloco de papel para anotar tudo o que o cliente disser. Não deixe passar nada. Quanto às anotações, mesmo que seja só um rascunho, procure fazer de forma organizada. Não amontoe palavras. Dê algum espaço entre um assunto e outro porque você, ao longo da conversa, pode precisar fazer alguma anotação complementar em alguma coisa que você escreveu algumas linhas acima. Anote e leia. Se não ficar claro pra você, peça para o cliente repetir e detalhar melhor. Lembre-se: sua função aqui não é ‘adivinhar’ e sim ‘registrar’. Acho que não preciso dizer que estas notas precisam ser guardadas até a entrega definitiva do sistema, preciso?
6 – Com quem fazer o levantamento de requisitos
Em geral fazemos este levantamento com o proprietário da empresa ou gerente do setor, que é quem nos procura. Mas nem sempre ele é o usuário final. Se este for o seu caso, então tenha a gentileza de falar também com os principais funcionários que irão interagir com o sistema. Eles podem lhe dar informações preciosas sobre necessidades e processos que o cliente/gerente não lhe passou. Esta conversa pode ficar para uma segunda visita, se for o caso, mas não deixe de tê-la.
Aliás, cabe aqui dizer que este usuário pode ser o anjo ou o demônio da sua vida. Ele tem, acredite, o poder de manter você na empresa ou exterminá-lo em definitivo. Sendo assim, cabe aqui a regra número um : seja gentil e atencioso.
7 – Não canse o cliente
Vamos fechar com 7 as dicas pra primeira visita de levantamento de requisitos. Gosto do 7. Olho no relógio quando for entrevistar o cliente. Lembre-se que por mais que ele queira um sistema, você esta interrompendo o dia normal de trabalho dele. Procure colher o maior numero de informações possíveis na primeira meia hora – acredite, isto é possível – e depois apenas leia suas notas em voz alta, confirme com o cliente se esta tudo correto, pergunte se tem alguma coisa mais a acrescentar, e já se prepare pra despedida. Pode ser que ele diga ‘por enquanto só lembro disso’, então já fica aí uma deixa pra você comentar que fará uma segunda visita já trazendo algumas notas – diagramas, rascunho de layout – pra apresentar e se ele lembrar de algo novo até lá já pode comentar pra acrescentar no sistema. Neste caso deixe pra fazer o orçamento apenas depois desta segunda visita – não diga a ele, mas prepare-se para voltar lá dentro de 15 dias no máximo. Quanto ao tempo de duração desta primeira visita, pode ser que ela demore um pouco mais se o cliente estiver à vontade e o ambiente estiver propício, mas deixe que esta demora seja uma escolha dele e não uma imposição sua. Peça o cartão de visita do cliente e deixe o seu. Se não houver cartão de visita, então troquem telefones, e-mails, facebook .. enfim, qualquer coisa que seja últil pra você falar com ele e vice versa.
Finito. Você sentou com o cliente, conversaram sobre o sistema, viu que não se tratava só de ‘um programinha’ e agora vai para o passo 2: pegar suas anotações que colocar em planilhas e diagramas que lhe permitam enxergar a dimensão do escopo do sistema. E este será o tema do próximo artigo.
Até lá.